Chá e o mindfulness
O mindfulness define-se como ter atenção consciente e intencional ao momento presente com interesse, curiosidade e aceitação. É estar ciente do que fazemos sem julgar, nos apegar ou rejeitar a experiência.
Este conceito de “atenção plena” acredita-se que tenha origem há aproximadamente 2.500 anos nos sutras (discursos e aforismos) do budismo e do hinduísmo, embora também seja influenciado pelo taoísmo, pelo sufismo e pelas filosofias do yoga.
Ao monge vietnamita Thich Nhat Hanh (nascido em 1926) é creditado, de acordo com especialistas, a autoria do primeiro livro traduzido para o inglês sobre mindfulness, chamado “O Milagre do Mindfulness“.
A proposta do mindfilness é fazer tudo com plena consciência, vivendo no presente. Utiliza a introspecção (como é feito na meditação budista) para entender melhor a mente e estabelecer uma conexão entre o corpo e a mente.
Se temos nossas mentes cheias de pensamentos de todos os tipos, sem espaços em branco, sentimos confusão, exaustão, fadiga. A prática da atenção plena nos permite criar espaços para acalmar a mente e ler nossos pensamentos à distância.

Os benefícios do chá e do mindfulness
O mindfulness estimula o conhecimento de nossas próprias emoções, aumenta a sensação de felicidade e gratidão. Combinando o prazer do chá e do mindfulness, acrescentamos os benefícios do chá, dando-nos um momento de introspecção, com um uso consciente da atenção.
Também produz melhorias notáveis na qualidade do sono, no relacionamento com outras pessoas, na clareza mental e na concentração que, afinal, causam um aumento na auto-estima.
Está provado que a prática da atenção plena favorece a neuroplasticidade, ou seja, a geração de novas conexões neurais para a transmissão de informações de maneira mais rápida e eficaz em nosso cérebro.
Todos nós podemos criar neurônios e novas formas de pensar. Ao transformar nossa maneira de pensar, podemos mudar a maneira como agimos e parar de reagir impulsivamente (no piloto automático) para então decidir conscientemente.
O mindfulness nos convida a nos conhecer observando nossos pensamentos e processos internos
Nos momentos em que a tecnologia ganhou muita atenção, a prática mindfulness nos permite “desconectar” do mundo eletrônico e nos reconectar a nós mesmos.
Se vivermos plenamente, com paixão, curiosidade, entusiasmo e humildade para continuar aprendendo, seremos capazes de transformar nossos impulsos em ações conscientes.
Para isso, precisamos nos conhecer internamente, saber quais coisas despertam nossos impulsos, estar atentos às situações que os geram e agir. A atenção plena é uma excelente ferramenta para alcançar essa transformação.
Neurologicamente, esta comprovado que a prática regular de mindfulness ajudar a secretar o hormônio do crescimento (HGH), que mantém os tecidos saudáveis do corpo, ativa o metabolismo, aumenta os níveis de energia e a massa muscular e melhora o humor.
Também aumentam os níveis de ocitocina no sangue (o hormônio da compaixão) que ajuda a reduzir os níveis de cortisol, responsáveis pelo estresse e desconfortos relacionados.
O aumento da ocitocina protege o sistema cardiovascular e ajuda a diminuir os níveis de gordura no sangue.
A prática de mindfulness ao beber chá
Todos nós podemos teorizar, mas como sempre digo em meus cursos, é necessário treinar. Para tudo na vida é preciso prática. Para se tornar um Sommelier, analista sensorial do chá, Tea Blender ou Tea master, é necessário primeiro adquirir o conhecimento, mas também é preciso agir e praticar, praticar e praticar.
Como quando vamos à academia … você se lembra dessa metáfora? O treinador indica uma rotina de treinamento, me diz quais exercícios fazer, quantas repetições, etc., mas sou eu quem tenho que fazer a ginástica. Se eu não pratico, não alcanço meus objetivos.
Com o chá e o mindfulness, acontece o mesmo: depois de aprender as técnicas para tomar chá com consciência plena, devemos começar a praticar. Nenhum atleta de elite permanece nos trilhos se deixar de fazer seus treinos.
Também não devemos “parar de treinar”, se queremos manter nosso corpo e mente em harmonia, como uma obra musical. Precisamos ter disciplina e tenacidade para seguir praticando, sempre com paixão e alegria, e assim, dia-a-dia, podemos melhorar.
“O importante não é ser melhor que outros, mas ser melhor que ontem”.
Jingoro Kano
Como provar o chá com consciência plena
Para mim, provar o chá é uma forma de meditação ativa. A degustação do chá é uma forma de atenção plena. Quando faço uma degustação, concentro toda a minha atenção na análise do chá e esqueço o mundo. Esse processo me ajuda a desconectar do mundo exterior, dos problemas e do ruído mental, e a me concentrar com total consciência no que sinto através dos sentidos.
A análise sensorial de chá é o processo pelo qual percebemos as propriedades organolépticas dessa bebida e as descrevemos. As propriedades organolépticas são as características físicas que o chá possui e que podemos perceber através dos sentidos, como textura, cor ou aroma.
A análise sensorial de chá é um processo através do qual procuramos identificar o aroma, cor, forma, textura, sabor e outros atributos ou qualidades do chá e expressá-los em palavras.
Quando fazemos um análise sensorial, todos os sentidos (olfato, visão, audição, paladar e tato) são postos a serviço da experiência de degustação.
Para realizar a análise sensorial do chá (o que chamamos de “cata do chá”), precisamos nos concentrar e prestar total atenção aos estímulos que percebemos, a fim de capturá-los e identificá-los (dar nomes). Isso é a atenção plena no chá.

Etapas da degustação técnica do chá
A degustação técnica do chá (que realizamos em nível profissional) possui uma série de etapas nas quais analisamos diferentes atributos do chá, utilizando os 5 sentidos:
- Identificação do o chá
- Exame das folhas secas: análise olfativa, visual e auditiva
- Preparação do chá.
- Equilíbrio do licor
- Exame das folhas úmidas: análise olfativa e visual
- Exame do licor: análise olfativa, visual e do sabor
Provar o chá com mindfulness é exatamente isso: trazer consciência total a um objeto de meditação, que pode ser a respiração, uma vela ou, como neste caso, o chá.
“Quando você vê, transforme-se em olhos.
Quando você ouve, toda a sua consciência
Deve alcançar seus ouvidos.
Ouvindo uma música ou ouvindo os pássaros,
Transforme-se em ouvidos.
Esqueça todo o resto, como se você fosse apenas ouvidos.
Alcance seus ouvidos com todo o seu ser.
Dessa forma, seus ouvidos se tornarão mais sensíveis.
Quando você está contemplando algo, uma flor
Ou um rosto bonito ou as estrelas, transforme-se em olhos.
Esqueça tudo,
como se o resto do seu corpo
Tenha abandonado a existência
E sua consciência seja apenas seus olhos.
Então esses olhos serão capazes de olhar
muito mais profundamente,
e você se tornará capaz
também de olhar para o invisível. “
Osho
Para fazer uma degustação técnica completa, podemos investir de 30 minutos a 1 hora ou mais em cada chá. Nesta avaliação sensorial completa do chá, para mim, é muito mais fácil obter abstração dos pensamentos e concentrar-se apenas nas percepções (full mindfulness!!! 😉). Mas, para isso, é necessário que o processo de degustação seja bem internalizado.
Se você não conhece bem a metodologia (as etapas e os atributos que devem ser avaliados), os pensamentos começam a interferir e com isso se perde um pouco do efeito mindfulness. Precisamos ter a técnica de degustação perfeitamente mecanizada para que o processo flua naturalmente como a água que corre em um rio.
Aqui poderá ver a ficha de análise que eu criei para documentar as descobertas da prova degustativa.


Exercício Mindfulness: O chá como instrumento para consciência plena, por Victoria Bisogno
Se você ainda não conhece a técnica de degustação, ofereço-lhe uma meditação passo a passo que eu faço e que tem um efeito curativo. Estas são as etapas básicas para você aprender como fazer uma degustação simples com consciência plena e, assim, levar o mindfulness para sua vida. Vamos praticar amigos !!!
- Começo procurando um lugar onde esteja tranquilo. Asseguro que não haja interrupções: aviso minha família ou colegas de trabalho para não me interromperem por 10 minutos. Desligo telefones e outros dispositivos eletrônicos.
- Procuro uma mesa e a deixo vazia (não uso toalhas de mesa, flores ou decorações).
- Coloco todos os utensílios para fazer o chá na mesa.
- Sento-me e corrijo minha postura.
- Fecho os olhos e foco na respiração, respirando fundo e expirando muito lentamente pelo menos três vezes.
- Respiro mais uma vez e solto o ar o mais lentamente que posso.
- Abro os olhos e começo a fazer chá.
- Observo a água cair na minha xícara
- Concentro-me na ampulheta e vejo o tempo passar.
- Quando o chá está pronto, tomo-o com as duas mãos e fecho os olhos.
- Eu me concentro durante alguns segundos em observar as sensações que a xícara gera em minhas mãos.
- Trago a xícara até o nariz e sinto seu aroma com os olhos fechados. Me concentro no cheiro do chá.
- Logo, trago a xícara à boca, ainda de olhos fechados, e saboreio meu chá, sempre focado nas sensações que ele desperta em mim.
- Saio da meditação, respirando fundo e expirando lentamente.